Cultura

Propriedades, efeitos e usos da maconha

Vamos partir do princípio para entender, afinal, o que é a cannabis? Aqui, contamos a você um pouco da história, usos e efeitos de uma das substâncias mais usadas ao redor do planeta.

Há milhares e milhares de anos atrás, no solo de um território que ainda nem tinha nome, nasceu uma plantinha. Mas essa não era uma plantinha qualquer, e logo o ser humano descobriu isso. Com tantas propriedades maravilhosas, muitos acreditaram que ela era um presente dos deuses. E por muito tempo ela foi vista assim, como um milagre na terra, e se tornou parte de ritos e religiões dos mais variados povos.

Ela se tornou remédio para dores diversas, inclusive as do parto. Do cânhamo, surgiu o primeiro papel – na China. A fibra virou muita coisa: tecido, tela, corda, e, se não fosse ela, o desenvolvimento do homem com certeza não teria sido o mesmo. Essa plantinha participou tão ativamente da nossa sociedade por tanto tempo que virou sagrada. Você com certeza já ouviu falar dela: cannabis, erva, ganja, marijuana, maconha e inúmeros outros apelidos.

Atualmente, após anos de uma proibição injusta, ela voltou a ser estudada e regulamentada ao redor do mundo. Embora a realidade brasileira esteja andando mais devagar do que gostaríamos, já tivemos alguns avanços notáveis, e a cannabis já pode ser usada de forma terapêutica e medicinal em diversos casos.

Aqui, vamos falar mais sobre essa substância, seus efeitos e usos na sociedade atual. Bateu a curiosidade? Vem com a gente!

Foto colorida de uma plantação, com foco em uma Flor de cannabis
Flor de cannabis

O que é a cannabis e de onde ela veio

Em termos gerais, a cannabis é uma planta que tem usos medicinais, terapêuticos e adultos. Produtos à base de cannabis vêm de frutos/flores secas, folhas, caules, raízes, e sementes da planta Cannabis sativa, indica ou plantas híbridas.

A planta possui seu primeiro registro em 27.000 a.C. A planta tem origem no Afeganistão e era também utilizada na Índia em rituais religiosos ou como medicamento. Na mitologia, a Cannabis era a comida preferida do deus Shiva, portanto, tomar bhang, uma bebida que contém maconha, seria uma forma de se aproximar da divindade. Na tradição Mahayana do budismo, fala-se que antes de Buda alcançar a iluminação, ficou seis dias comendo apenas uma semente de maconha por dia e nada mais. Como medicamento a planta era usada para curar prisão de ventre, cólicas menstruais, malária, reumatismos e até dores de ouvido.

Romanos e gregos usavam-na para a fabricação de tecidos, papéis, cordas, palitos e óleo. Heródoto, o pai da História, menciona a utilização do cânhamo (presente no caule da maconha), para fazer cordas e velas de navios. Inclusive, é bom mencionar o quão presente esta planta esteve na formação do Brasil, pois as velas e cordas das caravelas portuguesas que aqui chegaram também eram feitas de cânhamo, assim como muitas vestimentas dos portugueses.

O cultivo da maconha se expandiu da Índia para a Mesopotâmia, depois Oriente Médio, Ásia, Europa e África. Na renascença a maconha tornou-se um dos principais produtos agrícolas europeus, sendo pouco usada como entorpecente. Johannes Gutenberg, inventor e gráfico alemão, teve sua maior e mais famosa obra, A Bíblia de Gutenberg, a primeira Bíblia impressa, feita com papel de cânhamo. Irônico, né?! Com a “Santa Inquisição”, os católicos passaram a condenar o uso medicinal da maconha feito por “bruxas”, estas por sua vez foram queimadas por usarem a planta no feitio de remédios.

Na Bélle Époque (final do século XIX), a maconha virou moda entre os artistas e escritores franceses, mas era também utilizada como fármaco para dilatar brônquios e curar dores. Dentre os intelectuais que chapavam o coco, podemos citar: Eugene Delacroix, Victor Hugo, Charles Baudelaire, Honoré de Balzac e Alexandre Dumas. Eles se reuniam para fumar haxixe e pesquisavam sobre o efeito da droga no tratamento de doenças mentais. Nessa época o Brasil vendia cigarros de maconha em farmácias!

A maconha foi trazida para a América do Sul pelos colonizadores e as primeiras plantações foram feitas no Chile, por espanhóis. No Brasil, como já citamos, além das caravelas, durante o século XVI os escravos africanos traziam-na escondida na barra dos vestidos e das tangas, para que fossem usadas em rituais de Candomblé. Outra possibilidade da cannabis ter chegado até o nosso país é através dos marinheiros portugueses.

Mão segurando um Dry sift no Marrocos, com plantação de maconha ao fundo
Dry sift no Marrocos

Atualmente, como ela é usada?

Depois de um longo período de proibição global, a cannabis vem sendo mais e mais estudada por seus efeitos – que podem trazer alívio para as mais diversas doenças e condições. Além disso, o uso adulto também vem sendo discutido e regulamentado ao redor do planeta. Hoje, as principais formas de usá-la incluem:

  • fumar ou vaporizar;

  • preparando-a como um chá;

  • consumi-la na forma de comestíveis, como brownies, outros doces e mesmo adaptando a Cannabis na culinária;

  • aplicando-a como um tratamento tópico, em forma de cremes, óleos e outros;

  • usando-a em forma de concentrados, como haxixe;

  • tomá-la em cápsulas, tinturas, óleos ou suplementos.

Alguns dos ativos da cannabis são psicoativos (alteradores da mente), mas outros não. A potência e o equilíbrio dessas substâncias variam, dependendo da sua cepa, de como é cultivada e também como é processada. Elas são chamadas de canabinoides, e você provavelmente já ouviu falar delas!

Foto colorida de uma Plantação de cannabis
Plantação de cannabis

O que são os canabinoides e como funcionam?

A cannabis conta com mais de 100 substâncias em sua composição – e, dentre elas, estão os canabinoides. Eles interagem diretamente com nosso sistema endocanabinoide, que faz parte do sistema nervoso central e se distribui por todo o nosso corpo. Alguns dos principais são os canabinoides:

  • Tetrahydrocannabinol (THC): substância responsável pelos efeitos psicoativos da planta. É o primeiro canabinoide que vem à mente quando se pensa no uso adulto da erva. Ele é um agonista parcial tanto dos receptores CB1, encontrados principalmente no sistema nervoso central, quanto dos receptores CB2, localizados principalmente em células imunes, ambos pertencentes ao sistema endocanabinoide. É a ativação dos receptores CB1 que causa a sensação de chapadeira!

  • Canabidiol (CBD): o CBD é o mais falado quando se trata de cannabis terapêutica e medicinal. A substância é bastante apontada pelos seus efeitos calmantes. Ela também não apresenta a mesma interação com os receptores endocanabinoides que o THC. Assim, além de não provocar os efeitos comuns observados no THC, ele pode modulá-lo e diminuí-lo.

  • Cannabigerol (CBG): pouca gente ouve falar dele, mas o CBG é um dos canabinoides mais importantes que encontramos na plantinha. Ele é o pai químico do THC e do CBD, ou seja, ambos derivam dessa substância e surgem na planta através dela!

  • Canabinol (CBN): nem todo mundo gosta muito dele – afinal, o CBN é criado quando o THC da planta de maconha se degrada devido à idade ou exposição à luz. Entretanto, quando ingerido, o canabinol fornece um efeito sedativo que o torna ideal se você tem insônia.

  • Ácido tetracanabidinol (THCA): ele nada mais é do que a forma ácida do THC, que se converte no composto psicoativo quando exposto ao calor por meio de descarboxilação. Apesar de sua importância, há muitas pesquisas sobre ele.

Falar sobre as interações sinérgicas desses inúmeros compostos presentes na cannabis é muito importante! Na medicina atual, a prática comum de isolar o CBD do resto dos canabinoides. Entretanto, como podemos ver nas pesquisas sobre o Efeito Entourage, as substâncias trabalham em equipe para entregar apenas os melhores efeitos. O CBD isolado, portanto, pode não ter um desempenho tão bom quanto uma medicina full-spectrum de qualidade.

O estigma ao redor do THC, que o coloca como o componente “ruim” da cannabis pelos seus efeitos psicoativos, é uma prática que vem diretamente do proibicionismo. Mas é essencial lembrarmos que ele também tem a sua importância no nosso corpo e é um dos principais agentes para o tratamento de várias condições, além de potencializar os efeitos do próprio CBD.

Foto colorida de uma mulher Sentindo o cheiro de uma flor de maconha
Sentindo o cheiro de uma flor de maconha

Usos medicinais e/ou terapêuticos

De acordo com pesquisas e estudos recentes, a cannabis pode ser utilizada com tratamento para:

No Brasil, já é possível adquirir medicamentos à base de cannabis – embora possa ser um processo caro e complicado. Aqui, a gente conta todas as vias pelas quais você pode conseguir garantir seu uso.

Foto colorida de uma mão segurando um baseado, com filtro dos sonhos atrás
Fumando um beck

Principais efeitos da cannabis

Quando as pessoas usam cannabis, elas podem notar os seguintes efeitos:

  • um sentimento de felicidade, conhecido como euforia;

  • relaxamento;

  • mudanças na percepção, por exemplo, de cor, tempo e espaço;

  • um aumento no apetite;

  • sentir-se mais falante e sociável.

As substâncias ativas da cannabis agem como neurotransmissores ao se ligarem em estruturas nas células nervosas, chamadas receptores canabinoides, provocando seus efeitos.

Eles podem variar de pessoa para pessoa, e dependem da quantidade de cannabis utilizada, da pureza e da potência e quantidade das substâncias ativas presentes na erva escolhida. Quando é fumada, a maconha pode provocar efeitos em poucos minutos. Já em comestíveis, o efeito demora mais para ser sentido – mas podem durar por horas.

Além disso, simultaneamente aos efeitos que já citamos, pode ainda surgir tontura, distúrbios de coordenação e de movimento, sensação de peso nos braços e pernas, secura na boca e na garganta, vermelhidão e irritação nos olhos, e aumento da frequência cardíaca. Por causa disso, é ainda mais importante saber o que você está usando!

Efeitos negativos da cannabis

Embora, como já vimos anteriormente, a cannabis possa ser um verdadeiro milagre para a saúde de muitos, também precisamos estar atentos aos seus efeitos negativos e aos casos em que ela não deve ser utilizada (a menos que recomendada por médicos em um uso acompanhado).

Quando falamos em relações problemáticas com a substância, pelo menos 1.3 milhões de pessoas já se consideraram dependentes de maconha. Embora os sintomas de abstinência sejam mais leves do que de outras substâncias legalizadas, como o álcool ou até mesmo o café, algumas sensações desagradáveis podem ser experimentadas – ainda mais se o uso é contínuo.

E mesmo quando chapamos, nem tudo são flores! Pessoas que usam a erva cronicamente relatam que, ao interromper o uso, sentem:

  • Irritabilidade;

  • Mudanças no humor;

  • Dificuldades para dormir;

  • Diminuição do apetite;

  • Desejos;

  • Inquietação e/ou várias formas de desconforto físico.

Vale lembrar que cada pessoa é única, e o efeito da cannabis no corpo de cada indivíduo é extremamente subjetivo. Os efeitos experienciados podem variar, e geralmente envolvem o relaxamento, o alívio de dores, mudanças no humor, mais ou menos energia (dependendo da strain), aumento no apetite e na criatividade, entre outros. Mas eles podem mudar um pouco (ou bastante) quando pensamos em uso esporádico ou contínuo.

Além disso, o professor e pesquisador Sidarta Ribeiro elencou quatro grupos de risco para o uso de cannabis:

  • Gestantes e lactantes;

  • Adolescentes;

  • Pessoas com tendências à esquizofrenia;

  • Pessoas com tendência à depressão.

Você pode entender melhor esse assunto no nosso post sobre os efeitos negativos da cannabis.

Foto colorida de um pote de Haxixe sem solvente, com orquídea rosa ao fundo
Haxixe sem solvente

CURIOSIDADE: afinal, maconha é flor ou fruto?

Agora que você já sabe os principais pontos sobre a nossa plantinha favorita, temos uma curiosidade interessante para contar. No universo canábico, chamamos a parte mais consumida da cannabis de bud – e a consideramos uma flor, até pouco tempo atrás. Mas um estudo específico tem gerado debates ao sugerir que os buds não são flores, e sim frutos!

O pesquisador Kenzi Riboulet-Zemouli realizou um estudo de três anos, em paralelo a uma avaliação da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre a maconha, com o objetivo de identificar uma nomenclatura coerente para os derivados da planta de cannabis.

Riboulet-Zemouli explica que a consideração de “buds” (brotos, na tradução literal) como flores entra em conflito com as repetidas menções de uma maturidade de flores, aparentemente necessária para que seja feita a colheita. As flores não amadurecem: elas murcham e se transformam em frutos que, por sua vez, amadurecem.

O autor então sugere que a melhor abordagem seria considerar os “buds” não como flores ou inflorescências, mas sim como frutos ou infrutescências. As ciências botânicas modernas contemplam o desenvolvimento de frutos a partir de flores femininas não fertilizadas, um mecanismo denominado “partenocarpia”.

Ou seja:

Tecnicamente, a coisa correta a fazer seria se referir aos chamados buds como “frutos partenocárpicos” ou “infrutescência partenocárpica”. Estes tipos de frutos de nome estranho tem como característica principal se desenvolver sem que a flor tenha sido polinizada e sem produzir sementes. Portanto, esse seria o nome para se referir aos buds das plantas de cannabis não-polinizadas, preferidas para o consumo por atingirem maiores concentrações de canabinoides. Não são flores, são frutos partenocárpicos que amadurecem a partir das plantas fêmeas sem serem polinizadas.

Essa discussão está bastante fervorosa no universo canábico, e muitos biólogos discordam dessa afirmação.

E você, é time flor ou fruto?

E aí, curtiu esse apanhado de informações canábicas quentinhas para você?
Ficou com alguma dúvida?
Pode deixar a sua pergunta nos comentários, ou falar com a gente no IG @girlsingreen710.

Até a próxima!

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annaverbaeten@hotmail.com
1 ano atrás

Olá meninas, eu sou super fã do trabalho de vocês, estou lendo tudo com muita gana.
Gostaria de saber onde eu consigo as referências bibliográficas dos estudos de vcs, ou os textos usados de base.
Att Anna

Anna
Anna
1 ano atrás

Olá meninas, eu sou super fã do trabalho de vocês, estou lendo tudo com muita gana.
Gostaria de saber onde eu consigo as referências bibliográficas dos estudos de vcs, ou os textos usados de base.
Att Anna