Cultivo

Cultivo associativo: Uma forma de reduzir danos e lutar por direitos

Cultivadores que se unem para garantir o direito à cannabis de maneira segura e responsável, mesmo em meio à luta antiproibicionista. Isso existe em vários países, e vamos contar mais sobre o tema aqui!

Os clubes na Espanha e no Uruguai, e mesmo associações brasileiras como a Abrace Esperança e Apepi, são exemplos de como a população pode encontrar meios de se unir e de ajudar um ao outro por meio do que é chamado de cultivo associativo. Em alguns lugares, eles são permitidos; em outros, ocorrem por meio de brechas na legislação local. Aqui no Brasil, fazem parte de uma das frentes da luta pela regulamentação da cannabis, tanto medicinal quanto de uso adulto, e fazem até mesmo o que chamam de “desobediência civil pacífica” para garantir o acesso da erva àqueles que precisam.

Mas o que é exatamente e como acontece o cultivo associativo? Nesse post, a gente vai contar um pouco mais sobre isso para vocês!

Pai e filha da família Apepi, com cartaz em meio à marcha
Pai e filha da família Apepi

O que é o cultivo associativo?

O cultivo associativo é feito através de associações ou clubes, geralmente organizações sem fins lucrativos, onde se consome a cannabis com fins terapêuticos ou recreativos entre seus membros, de maneira compartilhada, pagando uma taxa mensal. Eles podem funcionar de maneira diferente dependendo do país e da sua legislação. Na Espanha, por exemplo, para ser legalmente constituída, a associação deve estar inscrita no registo regional de associações, e cada província estabelece normas básicas a serem cumpridas.

Aqui no Brasil, uma associação do tipo é Associação de Apoio à Pesquisa e a Pacientes de Cannabis Medicinal – Apepi. Ela ganhou, na semana passada, a autorização legal para plantar a cannabis necessária para produzir o óleo que os pacientes associados necessitam para o tratamento de crises de epilepsia. O que podemos dizer é que a associação é um grupo de pessoas que se une para ter acesso a uma cannabis de qualidade, sem precisar fazer o seu próprio cultivo em casa. 

E por que isso é importante?

As associações de cultivo são imensamente importantes e dão um suporte ímpar aos usuários, principalmente dos que buscam a cannabis de forma terapêutica – mas não apenas eles. O cultivo associativo:

  • Afasta o usuário do ambiente do crime, do narcotráfico e se torna mais seguro conseguir sua cannabis;

  • Facilita o acesso para pessoas que precisam da cannabis terapêutica e não conseguem cultivar em suas próprias casas

  • Do ponto de vista do consumo em si, há um controle de qualidade que não existe no mercado ilegal. A cannabis brasileira, no proibicionismo, é contrabandeada, e pode chegar podre, com cheiro de amônia, com fungos, e má qualidade em geral. Num mercado regulamentado, isso não estaria nas prateleiras;

  • A cannabis prensada e traficada perde a potência e o perfil canabinóide original devido ao armazenamento incorreto – o que pode levar o usuário a precisar de mais cannabis para ter um resultado satisfatório;

  • Grande parte dos remédios importados, cuja base é a cannabis, chegam ao Brasil custando até três mil reais. Nem todos os pacientes e suas famílias têm condições financeiras de bancá-los;

  • Pode ser um ambiente para o uso seguro de cannabis, e também um local que te aproxime do seu autocuidado ou mesmo de serviços de saúde;

As associações canábicas, portanto, têm o poder de amparar o usuário, tirá-lo de um contexto onde ele pode ser visto como criminoso, e ajudá-lo a conseguir a sua cannabis com maior segurança e qualidade. Esse tipo de cultivo é também uma Redução de Danos por todos esses motivos que a gente citou: na substância, no acesso e no direito. Afinal, quem precisa da nossa plantinha também não pode se expor ao perigo externo, ou de consumir algo que não é bom para seu corpo.

Flor de maconha de qualidade,  proveniente de cultivo associativo, no dichavador
Flor de qualidade, proveniente de cultivo associativo

Como as associações funcionam

Como já mencionamos, cada país tem uma regulamentação diferente em relação aos clubes e associações de cannabis. Aqui, vamos mostrar o que sabemos sobre essas instituições na Espanha, no Uruguai, e aqui no Brasil:

Clubes e associações na Espanha

As associações têm amparo legal, mas o recheio canábico vem com um mix entre cultivos regulamentados das próprias associações quanto do tráfico, principalmente haxixes provenientes do Marrocos. As pessoas só podem consumir a substância dentro da associação e necessitam de um cartão de sócio, que só podem obter sendo indicados por outro sócio. O problema é que qualquer usuário que for pego transportando a cannabis do clube para a sua residência pode ser punido com sanções administrativas (geralmente em forma de multas).

Existem muitas faltas de regulamentação que não são tão positivas nesse contexto. No início, essas associações eram mais voltadas ao consumo terapêutico. Hoje, existem clubes mais voltados ao lucro e à experiência do usuário, que procura as dependências para degustar a planta de uma forma segura. Ainda não existe também uma regulamentação quanto à qualidade da substância, e muitas associações se aproveitam dessas brechas e não fazem o cultivo da “maneira correta”, sendo alimentadas pelo tráfico internacional de drogas. Isso é um grande desafio: é algo entre garantir o seu direito e reduzir danos, mas também há o balanço, que é fazer parte dessa rede que nem sempre é tão segura quanto parece no país.

Clubes de cannabis uruguaios

Depois da regulamentação no Uruguai, as associações foram uma das primeiras formas de conseguir a cannabis. As regras para ter um clube canábico são simples: o grupo precisa ter entre 15 e 45 membros e em que cada um pode receber até 480 gramas por ano da planta, tudo para uso pessoal. Cada clube pode ter até 99 plantas, não necessariamente de propriedade das instituições, mas de pessoas maiores de 18 anos e que moram permanentemente no país sul-americano. Por fim, todos os clubes precisam ter uma sede com uma área dedicada ao cultivo e outra para o processo de seca das folhas, além de um lugar seguro de armazenamento e para embalagem.

No Uruguai, também não importa se você é paciente ou se usa a cannabis de forma recreativa, desde que tenha atingido a maioridade. Essas associações e clubes criaram até mesmo o turismo canábico, que atrai estrangeiros para experimentar as strains locais.

Associações no Brasil

No Brasil, as associações reúnem pacientes, médicos, advogados e militantes pela regulamentação da cannabis, e produzem pesquisas e estudos sobre o uso terapêutico da planta. Muitas delas foram criadas justamente por familiares de pacientes que podem ser beneficiados com a regulamentação da cannabis medicinal, que se unem para conseguir condições melhores de acesso à erva. Já falamos sobre a Apepi, mas também existem muitas outras: a Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis, por exemplo, é uma associação científica e possui em seu quadro de profissionais mais de 60 profissionais da área médica com mais de 249 prescrições para pacientes que precisam do tratamento com óleo extraído da cannabis. A Abrace é outra: ela possui laboratórios com farmacêuticos para a produção do medicamento canabidiol, além de promover workshops periódicos sobre as documentações necessárias para o paciente e para o médico terem acesso ao remédio. Ela atende casos de epilepsia, Alzheimer, Parkinson e câncer.

Por que apoiar essas associações?

As associações canábicas, aqui no Brasil, são agentes de Redução de Danos e lutam pelo aumento do acesso à cannabis medicinal e terapêutica. Com tantas pesquisas e estudos que temos hoje em dia, o maior obstáculo para a regulamentação da substância é a falta de informação e o preconceito – e esses grupos são ativistas que buscam mostrar justamente o quão beneficial a cannabis pode ser. Apoiar o cultivo associativo é muito mais do que uma questão antiproibicionista, mas também uma causa humanitária.

Afinal, sabemos melhor do que ninguém tudo o que o proibicionismo trouxe até hoje aos países onde ainda é vigente. 

Nós, do Girls In Green, adoramos as associações, e já tivemos a oportunidade de visitar algumas na Espanha e no Uruguai. Achamos incrível que elas garantem que mesmo as pessoas que não têm o “dedo verde” possam estar inseridas em um ambiente onde fazem parte da produção de seu próprio medicamento. Muitas delas permitem que o sócio ajude da maneira que pode ou sabe, sendo protagonistas responsáveis pelo seu próprio consumo.

Diferente do Uruguai, na Espanha há uma maior flexibilidade para quem entra nos clubes. A gente acha muito massa que exista um lugar assim, onde podemos usar nossa erva de forma segura. No início do ano, por exemplo, fomos para a Spannabis – que não aconteceu por conta do COVID-19. Mas tivemos a chance de participar dar a nossa primeira aula em espanhol sobre Redução de Danos  e autocuidado em um clube chamado Hot Box BCN! Existem vários locais que promovem práticas além do consumo da cannabis, como palestras, workshops e até aulas de yoga! (uma que adoramos e seguimos é o @dankgrassclub)

baseado aberto com Maconha e Haxixe
Maconha e Haxixe

Quer conhecer mais associações brasileiras?

Vamos postar, lá no nosso Instagram, o contato das principais associações canábicas do Brasil. Fique de olho e entre em contato com a que estiver mais próxima de você! Afinal, você também pode ajudar a causa – e ser ajudado por ela.

Curtiram saber um pouco mais sobre o cultivo associativo? Esse conceito é realmente incrível, e a gente quer que surjam cada vez mais associações aqui no nosso Brasil. Afinal, todo mundo merece ter acesso a uma cannabis com mais qualidade, com menos riscos e com mais amor envolvido.

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