GIRLS IN GREEN

Com um aumento no interesse pelas experiências psicodélicas, é preciso de preparo para lidar com todas as situações que podem se desenrolar. Vamos falar sobre isso?

Os psicodélicos estão provocando uma verdadeira revolução na medicina moderna, principalmente no campo da saúde mental. Essa onda é chamada por muitos de renascimento psicodélico, e, embora a gente fique cheia de esperanças quando ouve falar dele, precisamos lembrar que, como qualquer medicina, essas substâncias também equilibram riscos e benefícios. Por isso, é mais do que necessário falarmos sobre Redução de Danos e emergência psicodélica!

Todo remédio, seja ele alopático ou não, possui efeitos que dependem das necessidades e implicações únicas de seu usuário. As estratégias para mitigar possíveis efeitos adversos são ideias — mas como fazer isso em meio ao proibicionismo e a tanto estigma negativo? 

A solução está no cuidado e na informação.

Hoje, vamos falar sobre como as “bad trips” e emergências psicodélicas podem ser encaradas no contexto da saúde mental, e também trazer a ótica da Redução de Danos para entendermos como agir ao nos depararmos com situações adversas.

Vem saber mais!

Ilustração de uma pessoa encolhida,  tendo uma experiência desafiadora
Experiências psicodélicas e bad trips Fonte: Alex Grey

A substância psicodélica e a cura

Atualmente, com o aumento das pesquisas em torno de substâncias, como psilocibina, DMT (princípio ativo encontrado na ayahuasca), MDMA, LSD, ketamina e outras, trouxeram a nossa atenção às terapias psicodélicas. Entretanto, o assunto nem sempre é tratado com responsabilidade: embora seja muito promissor, não podemos enxergá-lo como uma cura universal. Também não podemos esperar que um processo de cura seja livre de desafios.

Julie D. Megler, enfermeira com foco em saúde mental integrativa, presidente do conselho de administração da ERIE e cofundadora da Sage Integrative Health, coloca alguns pontos bem interessantes neste artigo. Para ela, é fundamental que a gente enxergue os medicamentos alopáticos como uma parte do processo em indivíduos com traumas ou condições mentais pré-existentes que procuram a terapia com psicodélicos. Isso porque pessoas em crise podem não ter energia suficiente para entrar em contato com as causas de seus problemas, e pode sim ser importante tratar os sintomas primeiro.

Ela traz o conceito da “janela de tolerância”. Segundo Megler, quando estamos dentro da janela de tolerância, agimos de forma mais racional, aberta a feedbacks ou terapias, e temos uma base mais concreta para explorar nossas conexões espirituais. Porém, fora dessa janela, conseguimos focar apenas na sobrevivência.

ilustração de uma pessoa tendo uma experiência psicodélica desafiadora, com a cabeça aberta mostrando uma pessoa boiando na água
A emergência espiritual é uma etapa complexa de uma transformação psicológica que envolve o ser como um todo 

Emergência espiritual e saúde mental

Entender a nossa janela de tolerância pode ajudar bastante a diferenciar uma emergência espiritual de um problema relacionado a nossa saúde mental. Mas o que seria uma emergência espiritual?

Para os Grof, criadores do método da respiração holotrópica, a emergência espiritual é um movimento que fazemos em busca da expansão da consciência. Isso requer: 

  • Uma saúde emocional e psicossomática fortalecida;
  • Liberdade de escolhas pessoais;
  • Conexão profunda consigo mesmo, com o outro, com a natureza e com o cosmos.

A experiência psicodélica nem sempre garante uma emergência espiritual, mas sabemos que ela aumenta a probabilidade de que o usuário ou paciente de uma terapia com psicodélicos tenha insights e reflexões que levem a conexões espirituais e emocionais mais profundas. Para muitos que procuram essas substâncias, a emergência espiritual é um fator fundamental — mas, para ter uma emergência espiritual, precisamos estar dentro da janela de tolerância.

Por mexerem com tantas coisas dentro da gente, mesmo as pessoas mais preparadas podem acabar em crise. As crises podem tanto ser um sinal da própria emergência espiritual quanto de uma questão de saúde mental mais profunda e que requer atenção. 

Ainda de acordo com os Grof, a emergência espiritual é uma etapa complexa de uma transformação psicológica que envolve o ser como um todo, e por si só já é um ponto de crise. Mas ela pode assumir a forma de estados incomuns de consciência, que, por sua vez, podem envolver pensamentos incomuns, emoções intensas, visões e até manifestações físicas. Não existe nenhuma garantia de que tudo o que você experimentar vá ser bom ou prazeroso — e aí que surgem as “bad trips” e emergências psicodélicas.

Montagem fotográfica de um sujeito tendo uma experiência desafiadora
“Bad trips” e emergências psicodélicas Fonte: uol

“Bad trips” e emergências psicodélicas

Não são poucos os casos que ouvimos (ou presenciamos) de pessoas tendo experiências desafiadoras com psicodélicos. Muitas vezes elas são chamadas de “bad trips”, ou de emergências psicodélicas. Elas podem envolver questões difíceis, como reviver um trauma, passar por momentos de paranoia e sintomas físicos e psicologicamente desconfortáveis.

Mas nem sempre isso acontece apenas durante a experiência com psicodélicos. Muitos podem “sair da janela de tolerância” depois dela, e apresentar comportamentos como:

  • Problemas de sono;
  • Incapacidade de se manter na rotina;
  • Perda de interesse em responsabilidades sociais, familiares e profissionais;
  • Incapacidade de tomar conta de si mesmo e de funções básicas, como alimentação e higiene pessoal;
  • De forma geral, colocar a si mesmo e/ou aos outros em perigo.

E o que fazer para prevenir tudo isso?

Primeiro, você deve estar muito bem preparado. Se você deseja ter uma experiência psicodélica, conheça bem a substância escolhida, seu histórico médico e psiquiátrico, e tome todas as decisões com muita consciência a partir disso. Se você vai estar com algum amigo ou ente querido, as mesmas precauções são necessárias! 

Também é preciso ter um plano para emergências, que envolve:

  • Ter um treinamento básico de primeiros socorros e saber identificar situações de perigo, não só mental como físico. Os psicodélicos são substâncias químicas que podem causar reações adversas, assim como qualquer outro remédio ou droga — legal ou ilegal; 
  • Entender a substância que você ou outro indivíduo irá usar, bem como sua procedência e a dosagem;
  • Estar atento ao setting, ter comida e água disponíveis e um ambiente seguro e bem preparado, e ao set, que é o estado mental de quem vai utilizar a substância;
  • Não ficar sozinho ou deixar a pessoa sozinha;
  • Ter os contatos de serviços de emergência em caso de problemas sérios.
Fotografia de uma paciente em terapia psicodélica, sendo assistida por duas trip sitters
Trip sitting Fonte: NY Times

Aqui no blog, já falamos um pouco sobre trip sitting e os cuidados com quem vai ter uma experiência psicodélica. Isso tudo é fundamental! 

Em contextos de festas, geralmente quem dá conta disso são os profissionais da Redução de Danos, que são treinados e capacitados para lidar com os desafios que essas substâncias podem oferecer ao outro. Eles também dão orientações e podem oferecer serviços de testagem, para garantir que a droga escolhida não está adulterada e, por si só, não oferece um risco maior do que a própria experiência.

Tive uma bad trip. E agora?

Se você passou por uma emergência psicodélica, provavelmente pelo menos um dos fatores substância, set e setting estavam em desequilíbrio. Se você tomou um psicodélico em uma festa e teve uma experiência negativa, por exemplo, pode ser que fatores externos (como muitas pessoas, música alta e ambiente agitado) tenham sido menos favoráveis para a sua experiência. Pode ser que a qualidade da substância ou a dosagem também não tenham sido ideais.

Mas muitas “bad trips” envolvem nosso próprio estado mental. Nesse caso, procurar ajuda e atendimento psiquiátrico pode ser a melhor solução.

Pessoas que já contam com problemas, como depressão e ansiedade, ou passaram por situações traumáticas, podem precisar de um espaço ainda mais controlado, com pessoas treinadas à disposição, para poder lidar com os insights e desafios de sua experiência. Por isso, a terapia com psicodélicos menos experimental e mais científica conta com métodos e etapas bem estabelecidas, e são acompanhadas por profissionais habilitados.

Se esse é o seu caso e você está procurando por psicodélicos justamente para isso, nossa maior recomendação é não tomar as substâncias por conta própria. Tenha cuidado acima de tudo, ok?

E aí, gostaram de saber mais sobre essa temática? A gente é apaixonada por ela, e acreditamos que, quando praticada com responsabilidade, a terapia com psicodélicos e as experiências com eles, de maneira geral, podem ser bastante positivas. E as bad trips podem ser um alerta importante para que você dê atenção a sua saúde mental.

Para saber mais sobre psicodélicos, maconha e tudo que há de bom, segue a gente lá no Instagram @girlsingreen710. E, se você já passou por uma emergência psicodélica, conta aqui pra gente como foi e como você lidou com ela.

Até a próxima!

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